3º Ritual Lakota - Hanbletcheyapi - Imploração da Visão
A Imploração da Visão, igualmente
à purificação na itipi, já era praticada muito antes do Tchanunpa chegar à
Terra. Este tipo de oração é muito importante; é, de certo modo, o centro de
nossa religião e graças a ela temos recebido muitos favores, tais como estes
quatro grandes ritos: A Dança do Sol, O Parentesco, A Preparação da Menina, O
Lançamento da Bola. Todo homem pode implorar uma visão, pois que antigamente,
homens e mulheres imploravam constantemente.
O que assim se obtém depende em
parte do caráter de quem implora; de fato, só os homens verdadeiramente
qualificados recebem as grandes visões, e estas são rapidamente interpretadas
por nossos homens santos (Witchashawakan); dão força e saúde à nossa tribo.
Quando alguém deseja implorar, é muito importante que peça a ajuda e os
conselhos de um homem santo, Witchatchawakan, a fim de que tudo se cumpra de
uma forma correta, porque se as coisas não são feitas segundo as regras, pode
acontecer alguma desgraça; poderia, por exemplo, aparecer uma cobra e se
enrolar no implorante.
Todos já devem ter ouvido falar
de nosso Grande Chefe e Xamã Tashunka Witko, Crazy Horse; mas provavelmente não
sabem que seu grande poder lhe vinha, sobretudo, da Imploração da Visão, que
praticava várias vezes ao ano, inclusive no inverno, com um clima muito frio,
muito duro, com muita neve.
Recebeu as visões do Penhasco, da Sombra, do
Texugo, do Cavalo que Empina, daí seu nome, do Dia, e também de Wambligleshka
(Spotted Eagle, Águia Pintada; e recebeu de todas estas visões muito poder e
santidade. Muitas razões podem induzir o homem a se retirar ao cume de uma
montanha para implorar.!!!
Alguns tiveram visões quando eram
crianças e sem esperar; neste caso, vão implorar para compreendê-las melhor. Imploramos
também quando desejamos aumentar nosso valor com vistas a uma grande prova,
como a Dança do Sol, ou para nos preparar para partir pelo caminho da guerra.
Às vezes se implora para pedir algum favor a Wakan Tanka, como a cura de um
parente; imploramos também para dar graças a Wakan Tanka por algum dom que nos concedêra.
Mas a razão mais importante para
implorar, é, sem dúvida, que Wakan Tanka nos ajude a dar conta de nossa unidade
com todas as coisas, a compreender que todas as coisas são nossos parentes e
então, em seu nome, pedimos ao Grande Mistério que nos dê o conhecimento de Si
mesmo, Ele que é a fonte de tudo e que é maior que tudo.
Nossas mulheres também imploram,
depois de se purificar na itipi; outras mulheres as ajudam, mas elas não vão a
uma montanha elevada e deserta; se retiram para uma colina do vale, porque são
mulheres e necessitam segurança e proteção. Quando um índio deseja implorar,
vai com um Tchanunpa cheio até um Homem Santo (Witchashawakan); entra em sua
tipi sustentando a haste com a mão direita e se senta na frente do ancião que
será seu guia.
O implorante põe o Tchanunpa no
solo com a haste apontada para si, porque é ele quem deseja adquirir o
Conhecimento. O Witchashawakan eleva, então, as mãos para o Grande Espírito e
depois para as Quatro Direções, e pegando o Tchanunpa pergunta ao implorante o
que deseja.
"Desejo implorar e oferecer
meu Tchanunpa ao Grande Espírito. Tenho necessidade de Tua ajuda e de Teus
conselhos, e desejo que envies uma voz por mim às Potências do Alto."
A que o ancião responde:
"How! Hetchetu Yelo!"
E os dois saem da tipi; depois de
andar um pouco, param e olham para o Oeste; o implorante está à esquerda do
Witchashawakan. As pessoas que estão nas proximidades se unem a eles. Todos
levantam a mão direita, e o ancião reza, ao mesmo tempo em que dirige a haste
do Tchanunpa para o céu.
"Hi ey Hey i i! Hi ey Hey i i! Hi ey Hey i i! Hi ey Hey i i!
Avô Wakan Tanka, Tu és o
primeiro, e Tu tem sido sempre! Todas as coisas Te pertencem. Tu és quem criou
todas as coisas. Tu és misericordioso e único, e nós Te enviamos uma voz. Este
implorante que está aqui presente se encontra em dificuldade e deseja Te
oferecer o Tchanunpa. Pedimos que lhe ajude! Dentro de poucos dias Te oferecerá
seu corpo. Porá seus pés sobre a Terra Sagrada, nossa Mãe e Avó, conforme o
Mistério. Todos os poderes do mundo, o céu e os povos das estrelas, e os dias sagrados vermelho e azul, todas as
coisas que se movem no Universo, nos rios, os arroios, as fontes, todas as
águas, todas as árvores que se erguem e todas as ervas da nossa Avó, todos os
Povos Sagrados do Universo: escutem! Este implorante pedirá um parentesco
sagrado com todos vocês a fim de que suas gerações futuras cresçam e vivam
segundo o mistério. Ó Ser Alado de onde o sol se põe, Tu que velas por nosso
Tchanunpa Wakan, ajude-nos. Ajude-nos a oferecer este Tchanunpa ao Grande
Espírito para que dê sua bênção a este implorante!”
Então os demais gritam:
"How!"
E se sentam em círculo no solo. O
ancião oferece o Tchanunpa às Seis Direções (Note,Sul,Leste,Oeste,Em cima e Em
baixo) o acende e o dá primeiro ao implorante, este o oferece com uma reza, e
todos os que formam o círculo fumam dele. Quando o Tchanunpa foi todo fumado, é
devolvido ao Witchashawakan, que o limpa, o purifica e o entrega de novo ao
implorante, perguntando quando deseja implorar, então se escolhe o dia. Quando
chega o dia eleito, o implorante vai só, vestido com sua pele de búfalo, seu
tapa sexo e seus mocassins; chega, chorando, com seu Tchanunpa à tipi do
Witchashawakan. Assim que entra, põe sua
mão direita sobre a cabeça do ancião. dizendo:
"Únshiwala ye!" (Tenha
misericórdia de mim)
Põe seu Tchanunpa em frente a
Witchashawakan e pede sua ajuda. O ancião responde:
"Todos sabemos que o
Tchanunpa está cheio de Mistério, e com ele você veio chorando. Quero lhe
ajudar, mas deverá se lembrar sempre do que vou lhe dizer, nos invernos
futuros, procederá segundo as instruções e os conselhos que lhe darei. Pode
implorar de um a quatro dias ou até mais, se desejar; quantos dias
escolhe?"
"Escolho dois
dias."
Bem, eis aqui o que deves fazer:
primeiro construirá uma itipi (tipi de suar), onde nos purificaremos, e para
isto deve selecionar doze ou dezesseis salgueiros pequenos. Mas antes de cortar
os salgueiros, não se esqueça de lhes fazer uma oferenda de tabaco, e quando
estiver frente a eles, diga:
"Há muitas espécies de árvores, mas fostes os escolhidos para me ajudar. Vou
arrancá-los, mas outros virão em seu lugar."
Em seguida, levará estas árvores ao lugar onde
construiremos a itipi. Reunirá piedosamente pedras e sálvia e fará um feixe de
cinco hastes, tábua para cortar o tabaco, uma pele de gamo para envolver as
oferendas de tabaco, erva aromática, um saco de terra sagrada, uma faca e um
machado de pedra. Deverá procurar estes objetos você mesmo, e quando estiver
preparado nos purificaremos.
"Hetchetu yelo"
Quando tiver a itipi e tiver
reunido todos os utensílios, o homem santo entra nela e se senta a Oeste; o
implorante entra em seguida e se senta ao Norte; em seguida um ajudante entra e
se senta ao Sul do ancião. Levam então para a itipi uma pedra fria que é
colocada no lado Norte do altar central, onde o homem santo a purifica com uma
breve reza; em seguida o ajudante volta a levá-la ao exterior. É a primeira
pedra destinada ao lugar perpétuo - Peta Owihankeshni - que foi feito a Leste
da itipi.
A Leste do altar central, na
itipi, o ajudante limpa a terra, tirando os ciscos, e deposita uma brasa
naquele lugar. Então o homem santo caminha em círculo para o Leste e, se
inclinando sobre a brasa, coloca um pouco de erva aromática e reza assim:
"Ó Avô Wakan Tanka,
Olha-nos! Sobre a terra sagrada coloquei esta erva que Tu criaste. A fumaça que sobe desde a terra é o fogo que
pertencerá a tudo o que se move no Universo: aos quadrúpedes, aos voláteis, e a
tudo o que existe. Te darão sua oferenda, ó Wakan Tanka! Queremos consagrar a
Ti tudo o que tocamos!"
No momento em que se põe a erva
aromática sobre a brasa, os outros dois homens na itipi exclamam:
"Hay ye! Graças sejam dadas!"
E quando a fumaça sobe o homem
santo a espalha pelas mãos e em seguida passa as mãos por seu corpo; o
implorante e o ajudante se purificam da mesma maneira com a fumaça do Mistério.
O saquinho de terra também é
purificado e os três homens voltam a ocupar seus lugares a Oeste; todos os
deslocamentos são feitos no sentido do movimento do sol. A terra purificada é
derramada cuidadosamente com um movimento circular no interior da cavidade
central, e este gesto é feito lenta e respeitosamente, porque esta terra
representa todo o Universo.
O ajudante entrega um bastão ao
homem santo, que se serve dele para assinalar quatro movimentos ao redor da
cavidade, a Oeste, ao Norte, a Leste e ao Sul; em seguida desenha uma cruz,
cujas linhas vão de Leste a Oeste e a outra de Norte a Sul; e isto é
particularmente sagrado, porque esta cruz estabelece os Quatro Grandes Poderes
do Universo, assim como o Centro, nele reside o Grande Espírito.
Neste momento entra um ajudante
que trás uma brasa sobre um bastão aforquilhado; caminha lentamente, se detém
quatro vezes, e na quarta vez põe a brasa no centro da cruz. O homem santo,
suspendendo um pouco de erva aromática sobre a brasa, reza assim:
"Avô e Pai meu, Wakan Tanka,
Tu és tudo, todas as coisas Te pertencem! Vou por Tua erva sobre este fogo. Seu
perfume Te pertence."
Então o ancião baixa lentamente a
erva aromática até o fogo. O ajudante pega o Tchanunpa e, movimentando-se com
ele no sentido do movimento do sol, o dá ao homem santo, que assim reza:
"Ó Wakan Tanka, Olhe Teu
Tchanunpa! O suspendo sobre a fumaça desta erva. Ó Wakan Tanka, olha também
este movimento consagrado que temos feito. Sabemos que seu centro é Tua morada. As gerações caminharão
por este círculo. Os quadrúpedes, os bípedes, os voláteis e os Quatro Poderes
do Universo contemplarão este lugar, que é Teu."
O homem santo suspende o
Tchanunpa na fumaça, dirigindo a haste primeiro para o Oeste e em seguida para
o Norte, o Leste, o Sul e o Céu; depois toca a Terra com o pé do Tchanunpa. Purifica
todos os objetos ritualísticos e confecciona uns saquinhos de tabaco que amarra
no extremo dos bastões de oferendas. O ancião está agora sentado a Oeste; pega
a tábua para cortar o tabaco e começa a cortar e a misturar o tabaco. Mas antes
avalia cuidadosamente a capacidade do Tchanunpa, porque deve cortar o tabaco
somente para encher o fornilho, não mais. Cada vez que corta uma pitada de
tabaco a oferece a uma das Direções do Mundo e toma muito cuidado para que
nenhuma caia da tábua, coisa que irritaria os Seres Trovão, quando a mistura é
terminada, o ancião pega o Tchanunpa com a mão esquerda e, levantando uma
pitada de tabaco com a mão direita, reza assim:
"Ó Wakan Tanka, Pai e Avô
meu, Tu és o primeiro e sempre foi! Olhe para este implorante cuja alma está
turva. Ele deseja avançar pelo Caminho Sagrado; ele quer Vos oferecer este
Tchanunpa. Seja misericordioso com ele e
o ajude! Os Quatro Poderes e todo o Universo serão colocados no fornilho do
Tchanunpa, e então este implorante Te oferecerá com a ajuda dos Seres Alados e
com todas as coisas. O primeiro a ser colocado no Tchanunpa és Tu, ó Poder
Alado do lugar onde o sol se põe! Tu e Teus Guaridões sois antigos e estão
cheios de Mistério. Olha! Há um lugar para Ti no Tchanunpa. Ajude-nos com Teus
Dois Dias Sagrados Vermelho e Azul! "
O homem santo põe este tabaco no
Tchanunpa e levanta em seguida outro pouco para o Norte, onde vive o Gigante
Wazia:
"Ó Poder Alado do lugar onde
o Gigante tem sua tipi, de onde vêm os ventos purificadores e fortes; há um
lugar para Ti no Tchanunpa, ajude-nos com os dois dias sagrados que Tudo
possuis!"
O Poder desta Direção é
introduzido no Tchanunpa e uma terceira pitada de tabaco é oferecida ao Leste:
"Ó Tu que está aí onde sai o
sol, que guardas a luz e dá o Conhecimento, este Tchanunpa vais ser oferecido
ao Grande Espírito; Tu também terás um lugar nele; ajude-nos com teus Dois Dias
sagrados!"
O Poder do Leste é introduzido da mesma forma
no Tchanunpa e se eleva um pouco de
tabaco para o Sul, o lugar onde sempre retornamos.
"Ó Tu que controla os ventos
sagrados e que vive no lugar para onde sempre voltamos, Teu sopro dá vida; de
Ti vêm nossas gerações e para Ti retornam. Este Tchanunpa vai ser oferecido ao
Grande Espírito; há um lugar nele para Ti. Ajude-nos com os Dois Dias Sagrados
que possuis!"
Desta maneira os Poderes das
Quatro Direções foram introduzidos no fornilho do Tchanunpa, e o ancião levanta
agora um pouco de tabaco para o Céu; é para Wambi Galeshka, a Águia Pintada,
que está por cima de todas as coisas criadas e que manifesta diretamente o
Grande Espírito.
"Ó Wambli Galeshka, Tu que
dá voltas pelos céus mais elevados, Tu vês tudo o que há no céu e na
terra. Este implorante vai oferecer este
Tchanunpa ao Grande Espírito a fim de obter o conhecimento. Ajude-o, assim como aos que, por Teu
intermédio, enviam suas vozes ao Grande Espírito. Há um lugar para Ti neste Tchanunpa; dê-nos
Teus Dois Dias Sagrados Vermelho e Azul!"
Com esta reza, a Águia Pintada é
introduzida no fornilho do Tchanunpa; depois o ancião estende uma pitada de
tabaco para a Terra rezando assim:
"Ó Unchi e Ina, nossa Avó e
Mãe, Tu estás cheia de Mistério! Sabemos que nossos corpos vieram de Ti. Este
implorante deseja ser um com todas as criaturas, ajude-o! Há um lugar para Ti
no Tchanunpa; dê-nos Teus Dois Dias Sagrados Vermelho e Azul."
Assim, a Terra, que agora está
realmente presente no tabaco, é introduzida no Tchanunpa, e desta maneira os
Seis Poderes do Universo são convertidos em Um. Mas, a fim de que todos os
povos do mundo, sem exceção, sejam incluídos no Tchanunpa, o homem santo
oferece pequenas porções de tabaco para cada um dos seguintes povos alados:
"Ó pássaro que voa nos Dois
Dias Sagrados; Tu que crias tão bem a Tua família, que nós possamos crescer e
viver da mesma maneira! Este Tchanunpa logo será oferecido ao Grande Espírito e
aqui há um lugar para Ti. Ajude-nos!"
Com uma reza idêntica, se oferece
e se introduz no Tchanunpa pequenas porções de tabaco para a cotovia dos
prados, o meiro, o pássaro carpinteiro, o pássaro da neve, o corvo, a gralha, a
pomba, o falcão, o gavião, a águia careca, e o que sobra de tabaco é oferecido
pelo bípede que vai implorar, oferecendo-se a si mesmo ao Grande Espírito.
Em seguida o Tchanunpa é selado
com banha, porque o implorante o levará consigo quando for ao cume da montanha,
e ali o oferecerá ao Grande Espírito; mas não o fumará antes de haver terminado
o ritual e de haver se reunido novamente com o homem santo. Todas as varas e
todos os apetrechos, já purificados, são deixados fora da itipi, a Oeste.
Os três homens saem e se preparam
para o inipi, e retiram suas vestes com exceção do tapa sexo.
Todo aquele que está presente é
autorizado a participar deste ritual de purificação. O implorante é o primeiro
a entrar na itipi; depois de dar a volta na itipi imitando o movimento do sol,
se senta a Oeste. Pega seu Tchanunpa que foi deixado ali; depois se desloca no
sentido do movimento do sol erguendo o Tchanunpa com a haste voltada para o
Leste; conservará esta posição durante a primeira parte do ritual. O homem
santo entra em seguida e, passando por detrás do implorante, se senta a leste,
bem ao lado da porta. Todos os que desejam tomar parte no ritual ocupam então o
espaço que ficou livre e dois homens ficam do lado de fora na qualidade de ajudantes.
Um dos ajudantes enche um
Tchanunpa de forma ritualística e o entrega ao homem que está sentado à
esquerda do implorante.
A pedra que anteriormente foi
purificada é introduzida com um bastão aforquilhado, porque está muito quente;
esta pedra é deixada no centro do buraco consagrado. Em seguida é colocada uma
segunda pedra a Oeste, no mesmo buraco, e as outras são postas ao Norte, a
Leste e ao Sul. Durante esta operação, o homem que está com o Tchanunpa toca
todas as pedras com o pé do Tchanunpa e no mesmo momento todos exclamam:
"Hay ye! Hay ye!"
Em seguida o Tchanumpa é aceso, e
oferecido ao Céu, a Terra, às Quatro Direções e fumado por todos. A medida que
passa de mão em mão, cada homem se dirige a seu vizinho chamando-o por seu grau
de parentesco, e quando todos o fumaram, dizem em coro:
"Mitakue Oyasin!"
O homem que acendeu o Tchanunpa e
esvazia e deixa as cinzas sobre o altar central; depois de purificá-lo, o passa
para seu vizinho da esquerda, que o passa para fora da itipi. O ajudante o carrega
novamente, e o põe sobre o montinho sagrado com a haste dirigida para o Oeste.
A porta de itipi é fechada, e o homem santo, sentado a leste, começa a rezar na
obscuridade:
"Olha tudo quanto se move no
Universo está aqui! isto é respeito por todos."
E para terminar, todos exclamam:
"How!"
Depois gritam quatro vezes:
"Hi ey hey i i!"
E também quatro vezes:
"Wakan Tanka, Avô, nos veja!
Ó Wakan Tanka, Pai, nos veja.
Nesta grande ilha há um homem que
diz querer oferecer-te um Tchanunpa. Hoje cumprirá sua promessa.
A quem enviaria uma voz, senão a
Ti, Wakan Tanka, Avô e Pai nosso? Diz que seu pensamento está turvo e que tem
necessidade de Tua ajuda. Ao Te oferecer este Tchaunpa, oferecerá todo seu
corpo e toda sua alma. É chegado o momento; logo irá a um lugar elevado e ali
implorará para conseguir Tua ajuda.
Seja misericordioso com ele!
Ó vocês, os Quatro Poderes do
Universo, vocês, alados do ar, e todos os povos que se movem no Universo, todos
foram colocados no Tchanunpa.
Ajudem a esse implorante com o
conhecimento que o Grande Espírito lhes deu. Sejam misericordiosos!
Ó Wakan Tanka, permita que este
implorante tenha parentes!
Que ele não seja somente um com
os Quatro Ventos, os Quatro Poderes do Mundo, e com a Luz do Alvorecer. Que
compreenda seu parentesco com todos os povos alados e do ar. Ele colocará seus
pés sobre a terra sagrada do cume de uma montanha; que ele possa receber, lá no
alto, a sabedoria; que suas gerações futuras permaneçam conforme o Mistério!
Todas as coisas te agradecem ó Wakan
Tanka! Tu que és misericordioso e que ajuda a todos.
Pedimos de Ti tudo isto, sabendo
que Tu és o Único e que Teu Poder se estende sobre todas as coisas."
Enquanto se verte um pouco de
água sobre as pedras ardentes, todos os homens cantam:
"Avô, envio uma voz! Aos
céus do Universo, envio uma voz. Para que meu povo viva!"
Enquanto os homens cantam e o
vapor ascende, o implorante chora copiosamente, porque se humilha ao pensar em
sua nulidade na presença do Grande Espírito:
"Tenha piedade de mim, ajude-me!"
O Tchanunpa passa de mão em mão e
todos o abraçam e choram como o implorante. Deste modo é posto para fora da
itipi, e os ajudantes também o abraçam; e depois o colocam sobre o montinho com
a haste para o Leste; esta é a Direção em que se encontra a Fonte da Luz e do
Conhecimento.
O segundo Tchanunpa, que deve ser
usado no rito de purificação e que estava sobre o montinho de terra sagrada com
a haste para o Oeste, é introduzido na itipi e entregue à pessoa sentada
imediatamente à esquerda do implorante. Este Tchanunpa é aceso e depois todos
os membros do círculo fumam dele; depois é novamente levado para fora da itipi.
Em seguida se faz circular água e o implorante é autorizado a beber dela tanto
quanto deseje, mas deve ter cuidado em não derramar nenhuma gota, nem no solo
nem sobre seu corpo, porque isto provocaria a ira dos Seres Trovão que cuidam
das Águas Sagradas e que poderiam aparecer pela noite enquanto implora. O homem
santo lhe diz para salpicar o corpo com sálvia; a porta é fechada novamente, e
um homem honrado que já tenha tido uma visão reza:
"Sobre esta pedra cheia de
Mistério, os Seres Trovão se mostraram misericordiosos comigo; deram-me o poder
proveniente do lugar onde vive o Gigante Wazia. Apareceu-me uma águia. Ela te
verá também quando fores implorar uma visão. Do lugar onde sai o sol me
enviaram uma águia careca; ela te verá também. Do lugar para onde sempre
voltamos, me enviaram um ser alado. Foram muito misericordiosos comigo. Nas
alturas do Céu há um Ser Alado que está perto do Grande Espírito; é a Águia
Pintada, e ela também te olhará. Te olharão todos os Poderes e a Terra Sagrada
sobre onde estás. Eles me indicaram um bom caminho para seguir nesta Terra; que
possa você também conhecer este caminho! Ponha teu espírito a compreender o
significado destas coisas, e verá! É assim, não esqueça! Hetchetu Yelo!"
Então este ancião canta:
"Eles me enviam uma voz, Do
lugar onde se põe o sol, Nosso Avô me envia uma voz, Do lugar onde se põe o sol,
Falam-me quando vêm, A voz de nosso Avô me chama, Este Ser Alado que está no
lugar onde vive o Gigante, Me envia uma voz, Me chama, Nosso Avô me chama!”
Enquanto o ancião canta, se
coloca água sobre as pedras, e depois de uns momentos de silêncio em meio a
obscuridade e do vapor quente e cheiroso, é aberta a porta, e o ar fresco e a
luz enchem a pequena itipi. Novamente se retira o Tchanunpa do montinho e o
entregam ao homem que está sentado ao Norte. Depois que é fumado, é recolocado
no montinho com a haste voltada para o Leste. A porta é fechada novamente e o
homem que está sentado a leste é quem reza:
"Ó Wakan Tanka, observe
quanto aqui fazemos e Te pedimos! Ó Poder do lugar onde o sol se põe, Tu que
controlas as águas; com o sopro de Tuas águas este implorante se purifica. E
também você, ó pedras de uma idade imemorial que agora nos ajudam, escutem!
Estão firmemente fixadas nesta terra; sabemos que os ventos não podem vos
mover. Este implorante vai enviar uma voz e implorar para obter uma visão; Vocês
nos ajudam dando uma parte de seu poder, seu sopro o purifica. Ó Fogo eterno do
lugar onde sai o sol, contigo este implorante ganha em força e lucidez. Ó
árvores, o Grande Espírito vos deus o poder de permanecer em pé. Que este
implorante possa sempre tomar vocês como exemplo; que possa se juntar firmemente
a vocês. Que assim seja! Hetchetu Yelo!"
Novamente todos cantam; em
seguida a porta é aberta e o Tchaunpa é entregue ao homem santo sentado a
Leste, que o acende, dá umas baforadas e o faz circular por todo o grupo. Quando
o tabaco é consumido, o ajudante pega o Tchanunpa e o coloca outra vez no
montinho, com a haste dirigida para o Sul. A porta da itipi é fechada pela
última vez, e então o homem santo dirige sua reza às pedras:
"Ó vocês, pedras antigas,
estão cheias de Mistério, não têm ouvidos nem olhos, e assim mesmo vêem e ouvem
todas as coisas. Graças a seus poderes este jovem está purificado e digno de
partir para receber uma mensagem do Grande Espírito. Logo os homens que guardam
a porta desta itipi sagrada a abrirão pela quarta vez e veremos a luz do mundo.
Tenham piedade dos homens que guardam a porta. Que suas gerações sejam
benditas!”
Verte-se água sobre as pedras que
ainda queimam e, depois que o vapor enche rapidamente toda a itipi, a porta é
aberta e os homens exclamam:
"Hi ho! Hi ho! Pilamaya ye! Graças sejam dadas!"
O implorante é o primeiro a sair
da itipi e, chorando copiosamente, vai sentar-se no caminho ritualístico, em frente ao montinho onde descansa o
Tchanunpa. Um dos ajudantes pega a pele de búfalo purificada e a põe sobre os
ombros do implorante; outro pega o Tchanunpa e o apresenta ao implorante, que
agora está preparado para ir a uma alta montanha implorar uma visão.
São trazidos três cavalos; em
dois deles são carregados os paus das oferendas e certa quantidade de sálvia, o
implorante monta o terceiro, chorando que até dá pena e erguendo seu Tchanunpa
a sua frente. Quando chegam ao pé da montanha, os dois ajudantes de adiantam
com todos os apetrechos para preparar lá em cima o início do ritual; avançam na
direção que lhes distancia mais depressa do acampamento e vão diretamente ao
local que foi escolhido como centro, ali descarregam os apetrechos.
Começam fazendo um buraco no
solo, e nele depositam um pouco de tabaco, em seguida cravam ali uma vara
comprida, em cujo extremo são atadas as oferendas. Um dos ajudantes dá dez
passos largos para o Oeste e crava ali outra vara com oferendas. Em seguida
regressa ao centro, onde pega outra vara, que vai cravar ao Norte, em seguida
volta ao centro. De modo semelhante, crava uma vara a Leste e outra ao Sul.
Enquanto isso, o outro ajudante esteve ocupado preparando um leito de sálvia no
centro, é nele que o implorante, em sues momentos de fadiga, poderá repousar
apoiando a cabeça na vara central , e estendendo os pés para o Leste.
Quando tudo está terminado, os
ajudantes abandonam o local sagrado pelo caminho do Norte e se reúnem com o
implorante, que espera ao pé da montanha. O implorante tira então os mocassins
e também o tapa sexo, porque, se desejamos sinceramente implorar, devemos ser
pobres em bens mundanos, e sobe até lá em cima, erguendo seu Tchanunpa à sua
frente e levando sua pele de búfalo, que usará durante a noite.
Enquanto caminha, chora e repete
constantemente:
"Wakan Tanka unshiwala ye
oyate wani wachin cha! Wakan Tanka tenha piedade de mim para que meu povo
viva!"
Quando chega ao local consagrado, se dirige
para a vara central e olha para o Oeste e levantando seu Tchanunpa com as duas
mãos, continua rezando entre lágrimas:
"Wakan Tanka tenha piedade de mim
para que meu povo viva!"
Em seguida se aproxima bem
lentamente da vara que está a Oeste, ali oferece a mesma reza e regressa ao
centro. Do mesmo modo vai até a vara do Norte, a do Leste e a do Sul, voltando
toda vez ao centro, e depois de cada um destes trajetos, eleva seu Tchanunpa ao
Céu e pede aos Seres Alados e a todas as coisas que lhe ajudem, depois dirige a
haste para o solo e pede a ajuda de tudo quanto cresce sobre nossa Mãe Terra.
Tudo isto é contado em pouco
tempo, mas o implorante deve executar tão lentamente e de uma maneira tão
solene, que às vezes necessita uma hora, ou até duas, para fazer cada um destes
trajetos.
Não pode se movimentar de nenhuma
outra maneira, mas enquanto percorre esta forma de cruz pode deter-se em
qualquer ponto do trajeto e durante o tempo que desejar. Isso é feito durante o
dia, rezando sem descanso, quer seja em voz alta ou silenciosamente em seu
interior, porque o Grande Espírito está em todas as partes e por conta disso
ouve tudo o que há em nossos pensamentos e em nosso coração, não é necessário
lhe falar em voz alta.
O implorante não está obrigado a
dizer sempre a reza que lhe foi indicada, pode permanecer em silêncio,
concentrando toda sua atenção no Grande Espírito ou em um de Seus Poderes.
Deve evitar cuidadosamente os
pensamentos que lhe distraiam, mas, por outro lado, tem de permanecer desperto
para reconhecer qualquer mensageiro que o Grande Espírito possa lhe enviar.
Estes mensageiros podem tomar a forma de um animal, às vezes tão minúsculo e
aparentemente insignificante, como uma formiga.
É possível que do Oeste venha
para ele uma Águia Pintada, ou do Norte uma Águia Negra, ou do Leste uma Águia
Careca, ou até do Sul, um Pássaro Carpinteiro de Cabeça Vermelha. Ainda que a
princípio nenhuma desta aves lhe fale, têm importância e devem ser observadas.
Se chegar um passarinho ou uma lagartixa, o implorante também deve fixar-se
nele. Talvez a princípio os animais se mostrem selvagens, mas logo se tornem
dóceis e os pássaros pousem sobre os paus, e também haverá formigas e pequenos
insetos que se moverão sobre o Tchanunpa.
Todos estes povos são
importantes, porque são sábios à sua maneira e podem ensinar muitas coisas aos
bípedes, se adotamos uma atitude humilde ante eles. Dentre todas as criaturas,
as mais dignas de atenção são as aves, são elas que estão mais perto do céu e
não estão atadas à terra como os quadrúpedes ou os pequenos povos répteis.
Convém lembrar que não é por
acaso que os humanos sejam bípedes como as aves, mas veja que estas abandonam a
terra com suas asas e que nós, os homens, podemos também sair deste mundo, não
com asas, mas com o espírito. Isto os ajudará a compreender em parte por que
consideramos sagrados e importantes todos os seres criados; toda coisa possui
uma influência - wochangi - que pode nos ser dada e graças a qual podemos
adquirir um pouco mais de compreensão, se estivermos atentos.
Durante todo o dia o implorante
envia sua voz ao Grande Espírito para obter Sua ajuda, e se movimenta seguindo
o caminho ritualístico em forma de cruz, esta forma tem muito poder. Cada vez
que voltamos ao centro é como se retornássemos ao Grande Espírito, que é o
centro de todas as coisas; e ainda que acreditemos que nos distanciamos Dele,
devemos regressar a Ele cedo ou tarde, junto com todas as outras criaturas. Ao chegar
a noite, o implorante está muito cansado, porque ele não pode beber nem comer
durante os dias que consagra para implorar uma visão. Pode cochilar no leito de
sálvia que lhe foi preparado e deve apoiar a cabeça na vara central, porque,
ainda que durma, permanece assim perto do Grande Espírito, e com muita
frequencia, as visões mais poderosas aparecem durante o sono.
Não se trata de sonhos normais,
pelo contrário, as visões são muito mais reais e mais intensas que os sonhos,
não provêem de nós mesmos, mas do Grande Espírito. Pode acontecer que a
primeira vez que imploramos não recebamos nenhuma visão nem nenhuma mensagem,
mas devemos tentar da mesma forma, porque não devemos duvidar que o Grande
Espírito está sempre disposto a ajudar a quem O busca com um coração puro. Em
consequencia, muito depende da natureza de quem implora, de seu grau de
purificação e de preparação. Às vezes pela noite vêm os Seres Trovão e, ainda
que sejam terríveis, nos fazem um grande bem pondo a prova nossa força e nossa
resistência. Eles também nos ajudam a nos dar conta de quão pequenos e
insignificantes somos frente aos Poderes incomensuráveis do Grande Espírito.
Me recordo de um dia em que
implorava, um grande furacão vinha do lugar em que se põe o sol, e eu
conversava com os Seres Trovão que vinham com o granizo, o trovão, os
relâmpagos e uma chuva abundante; pela manhã vi que o granizo estava amontoado
ao redor do local sagrado, mas este se achava completamente seco. Creio que
estavam me provando. E houve uma noite em que os maus espíritos vieram para
tirar as oferendas das varas, e ouvi suas vozes embaixo do solo e a um deles
que dizia:
"Vamos ver ele
implorar."
Ouvi ruídos de espíritos ruins,
mas eles permaneciam fora do recinto sagrado e não podiam penetrar nele, porque
eu estava decidido a não me assustar, e não parava de enviar minha voz ao
Grande Espírito para ter Sua ajuda.
Mais tarde, em algum lugar
embaixo da terra, um dos maus espíritos disse:
"Sim, certamente
implora."
E pela manhã vi que as varas e as oferendas
continuavam em seu lugar. Estava bem preparado, como podem ver, e não
fraquejei, de forma que nenhum mal podia me acontecer. O implorante deve se
levantar na metade da noite e ir até as Quatro Direções, voltando ao Centro
cada vez e sem deixar de enviar sua voz. Deve já estar de pé com as primeiras
luzes da manhã e iniciar caminhando para o Leste, dirigindo a haste do
Tchanunpa para a Estrela de Mistério e pedindo que lhe dê sabedoria, faz este
pedido em silêncio, no fundo de seu coração, e não em voz alta. Assim é como o
implorante deve proceder até o fim. Ao terminar o período determinado, vêm os
ajudantes com os cavalos e levam novamente o implorante com seu Tchanunpa ao
acampamento, quando chega, entra na itipi que foi preparada para ele.
Senta-se a Oeste, tendo
constantemente o Tchanunpa à sua frente. O santo ancião que é seu guia
espiritual entra imediatamente depois dele e, passando por trás do implorante,
vai se sentar a Leste, os demais homens ocupam o espaço livre que resta. A
primeira pedra ritual, que já foi aquecida, é introduzida na itipi e colocada
no centro do altar, as demais pedras são trazidas em seguida, tal como foi
descrito anteriormente. Tudo isto é feito de maneira muito solene, porém mais
rapidamente que antes, porque todos os homens estão impacientes para ouvir o
implorante e por saber que grandes coisas lhe aconteceram na montanha. Quando
tudo está pronto o homem santo diz ao implorante:
"Ho! enviaste uma voz ao
Grande Espírito. Desde agora deste Tchanunpa é muito sagrado, porque o Universo
inteiro o viu. Ofereceste este Tchanunpa aos Quatro Poderes Celestiais, Eles o
viram! O Poder Alado do lugar onde se põe o sol, que controla as águas, te
ouviu! As árvores que estão aqui presentes te ouviram! E também te ouviu o
Tchanunpa muito sagrado que a tribo recebeu. Diga-nos a verdade e se assegure
de que nada inventas! Quem sabe inclusive as formigas minúsculas e os pequenos
vermes vieram para te ver quando, lá em cima, imploravas por uma visão.
Diga-nos tudo! Você nos trouxe o Tchanunpa que ofereceu. Está terminado! E
visto que logo vais levar à boca este Tchanunpa, nos dirá a verdade. O
Tchanunpa é santo e sabe tudo, não pode enganá-lo. Se mentir, Wakinyan Tanka, a
Ave do Trovão que cuida do Tchanunpa, te castigará. Hetchetu Yelo!"
O homem santo então se levanta de
seu lugar a Leste e, dando a volta na itipi no sentido do movimento do sol, vai
se sentar à direita do implorante. Diante dele são colocadas umas costelas
secas e búfalo e sobre elas se coloca o Tchanunpa com a haste dirigida para o
céu. O homem santo tira o selo de sebo do fornilho e o põe sobre as costelas de
búfalo. Com uma brasa tirada do fogo, acende o Tchanunpa e, depois de Lhe
oferecer aos Poderes das Seis Direções, dirige a haste para o implorante, que a
toca apenas com os lábios.
O homem santo descreve então um
círculo com a haste, fuma um pouco, e o
aproxima novamente dos lábios do implorante. Torna a descrever um círculo com a
haste e dá mais umas baforadas. Isto é feito quatro vezes, depois o Tchanunpa
passa de mão em mão e todos os homens fumam. Quando regressa a ele, o homem
santo o esvazia golpeando-o quatro vezes no monte formado pelo selo de banha e
as costelas de búfalo, e, seguida o purifica. Erguendo o Tchanunpa frente a si,
então diz ao implorante:
"Jovem, faz três dias que se
foi daqui com teus dois ajudantes,
que construíram para ti os cinco pilares
do lugar consagrado. diga-nos tudo o que lá em cima depois da tua partida. Não
omitas nada! Temos rezado muito por ti ao Grande Espírito, e temos pedido ao
Tchanunpa para que seja misericordioso. Diga-nos agora o que aconteceu!"
O implorante responde, e cada vez
que diz algo importante, os homens que estão na itipi exclamam:
"Hay ye!"
"Fui para montanha, e depois
de entrar no recinto consagrado, caminhei para cada uma das Quatro Direções, regressando
sempre ao Centro, como tu me ensinaste. O primeiro dia, enquanto me encontrava
de frente para o lugar onde se põe o sol, vi uma águia que voava para mim, e
quando estava mais perto distingui que se tratava de uma Águia Pintada. Pousou
numa árvore próxima a mim, mas não disse nada, depois alçou vôo para o lugar
onde vive o Gigante Wazia."
A isto todos os homens respondem:
"Hay ye!"
"Regressei ao Centro e fui
até o Norte, e enquanto estava ali vi uma águia que dava voltas no alto, e
quando descia até mim notei que era uma águia jovem, mas ela também não me
disse nada, e logo retornou e vvou para o lugar que sempre olhamos. Voltei ao
Centro, onde implorei e enviei minha voz, e depois me dirigi para o lugar onde
sai o sol. Ali percebi algo que voava em minha direção e logo vi que era uma
águia careca, mas ela também não me disse nada. Implorando constantemente,
regressei ao Centro, e então, quando ia para o lugar a que sempre olhamos, vi
um pássaro carpinteiro de cabeça vermelha pousado no pau das oferendas. Quem
sabe me deu algo de sua natureza, seu wochangh, porque ouvi que me dizia em voz
muito baixa, mas clara: Wachin Ksapa yo! Fique atento! E não tenha medo, mas
não faça caso de qualquer coisa má que possa vir e te falar."
Todos dizem então em voz alta:
"Hay ye."
Porque esta mensagem da ave é
muito importante. O implorante continua:
"Ainda que tenha implorado e
enviado minha voz continuamente, isto é tudo o que vi e ouvi naquele dia.
Chegou a noite e me encostei com a cabeça no centro, e dormi, e durante meu
sono ouvi e vi meu povo e notei que era feliz.
Levantei-me no meio da noite e
andei novamente até cada uma das Quatro Direções, regressando sempre ao Centro
e enviando constantemente minha voz. Logo antes de aparecer o luzeiro da manhã
visitei novamente as Quatro Direções, e quando cheguei ao lugar onde sai o sol,
vi o luzeiro da manhã e observei que a princípio era vermelho, depois se tornou
azul, depois amarelo e ao final vi que era branco; e nestas quatro cores
discerni as quatro idades. Mesmo assim esta estrela não me falou, mas mesmo
assim me ensinou muito. Fiquei ali, esperando que saísse o sol, e no meio da
aurora vi o mundo cheio de pequenos povos alados cheios de alegria.
Por fim, saiu o sol, trazendo sua
luz ao mundo, comecei então a implorar e retornei ao Centro, e ali me deitei,
deixando meu Tchanunpa apoiado na vara central. Enquanto me encontrava
encostado ouvi a todo tipo de pequenos seres alados que estavam nas varas, mas
nenhum deles me falou. Olhei meu Tchanunpa e vi duas formigas que caminhavam
pela haste. Quem sabe desejavam me falar, mas logo se foram. Todo o tempo, enquanto
implorava e enviava minha voz, se aproximavam pássaros e mariposas; uma vez uma
mariposa branca veio a pousar no extremo da haste do Tchanunpa, agitando suas
belas asas.
Naquele dia não vi grandes
quadrúpedes, só animais pequenos. Logo antes do sol descer para ir repousar, vi
que as nuvens se agrupavam, e vieram os Seres Trovão. O relâmpago enchia o céu
e o trovão era aterrador, e creio que até me assustei um pouco. Mas mantive meu
Tchanunpa levantado e segui enviando minha voz ao Grande Espírito, e logo ouvi
outra voz que dizia: Hi ye hey i i! Hi ey hey i i!
Quatro vezes o disse, e então
perdi todo o medo, porque me recordei das palavras do pequeno pássaro e me
senti cheio de coragem. Ouvi também outras vozes que não pude compreender,
ignoro quanto tempo fiquei ali com os olhos fechados. Quando os abri, todas as
coisas eram muito brilhantes ainda que durante o dia, e vi um grande número de
homens que vinham para mim a cavalo, todos montavam cavalos de cores distintas.
Um dos cavaleiros se dirigiu a
mim nestes termos: Jovem, você oferece o Tchanunpa ao Grande Espírito, nos
alegramos muito que o faça! Isto é tudo o que me disseram, depois
desapareceram. No dia seguinte, imediatamente antes de sair o sol, e enquanto
visitava as Quatro Direções, vi o mesmo pequeno pássaro carpinteiro de cabeça
vermelha, estava pousado na vara do lugar que nós voltamos sempre e me disse
mais ou menos o mesmo que no dia anterior: Amigo, esteja atento quando caminha!
Isto foi tudo, e pouco depois os dois ajudantes vieram me buscar. Isto foi
tudo, e pouco depois os dois ajudantes vieram me buscar. Isso é tudo quanto
sei. E digo a verdade e não inventei nada!”
Assim é como o implorante termina seu relato.
O homem santo lhe dá seu Tchanunpa, que ele abraça e faz circular. Depois um
ajudante O pega e O coloca, com a haste
virada para o Oeste, no montinho sagrado, a Leste da itipi. São introduzidas
mais pedras quentes, é fechada a porta e começa o Oinikara. O homem santo se
põe a rezar e agradece ao Grande Espírito:
"Hi ey hey i i! Hi ey hey i i! Hi hey i i!
Hi hey i i!
E depois:
"Ó Avô Wakan Tanka! Hoje nos
ajudou. Foste misericordioso com este jovem ao lhe dar o conhecimento e um
caminho que possa seguir. Fizeste feliz o seu povo, e todos os seres que se
movem no Universo se alegram! Avô, este jovem Te ofereceu o Tchanunpa e ouviu
uma voz que lhe dizia: Esteja atento ao caminhar! Ele deseja saber o que significa
esta mensagem. Esta mensagem quer dizer que ele deverá sempre se recordar de
Ti, ó Wakan Tanka, enquanto caminhar pelo caminho sagrado da vida, e que deve
prestar atenção a todos os sinais que nos deste. Se ele sempre agir assim, se
transformará em um homem sábio e será um guia para o seu povo. Ó Wakan Tanka. Ajude-nos a estar sempre
atentos! Este jovem viu também as Quatro Idades nesta estrela do lugar onde sai
o sol. São as idades pelas quais devem passar todas as criaturas ao longo de
sua viagem que vai do nascimento à morte. Todos os povos e todas as coisas
devem passar por estas Quatro Idades. Ó Wakan Tanka, quando este jovem viu a
aurora do dia, viu como Tua Luz vinha ao Universo; é a Luz da Sabedoria.
Revelas-te todas estas coisas porque Tua vontade é que os povos do mundo não
vivam nas trevas da ignorância. Ó Wakan Tanka, Tu estabelecestes um parentesco
com este jovem, e com este parentesco trará vigor à sua tribo. Nós que estamos
aqui sentados representamos toda a Nação e Te agradecemos, ó Wakan Tanka.
Elevamos agora as mãos para Ti e dizemos: Ó Wakan Tanka, agradecemos por este
conhecimento e este parentesco que nos deste.
Seja sempre misericordioso conosco! Que este parentesco exista até o
fim."
Em seguida todos os homens
cantam:
Avô, me olhe! Avô, me olhe! Ergui
meu Tchanunpa e Te ofereci
Para que meu povo viva! Avô, me
veja! Avô, me veja!
Nós, que representamos a toda a
Nação;
Nos oferecemos a Ti; Para que
vivamos!
Depois deste canto se verte água
sobre as pedras e se prossegue o Onikare da maneira que já descrevi. Este jovem
que imploru por uma visão pela primeira vez se tornará quem sabe em um homem
santo, se caminhar com o pensamento e o coração fixos no Grande Espírito e em
Seus Poderes, como lhe foi ensinado, andará certamente pelo Caminho Vermelho
que conduz à bondade e à santidade. Mas deverá implorar uma visão pela segunda
vez, e então os maus espíritos podem lhe tentar, mas se é realmente um eleito
resistirá firmemente e vencerá a todos os pensamentos dispersantes; será purificado
de tudo o que é nocivo e poderá receber então alguma grande visão que dará
vigor à Nação.
Se depois desta segunda
imploração ainda tiver dúvidas, deverá tentar uma terceira e ainda uma quarta
vez, e se permanecer sincero e se humilhar frente todas as coisas, receberá
ajuda com certeza, porque o Grande Espírito ajuda sempre aos que lhe imploram
com o coração puro.
Em nossos dias, alguns lakotas
recorrem a um ritual diferente deste que foi descrito.
As mulheres estabelecem um
recinto sagrado no cume de uma montanha, preparando primeiro um leito de sálvia
disposto na direção Oeste-Leste e que tem uma pedra como almofada, se colocam
como oferendas umas bandeiras azuis, brancas, vermelhas e amarelas, nos quatro
pontos que formam um retângulo ao redor do leito. Nestes mastros se colocam
umas bolsas de tabaco como oferenda. Três largos cordões, em cada um dos quais
se amarra uma centena de saquinhos de tabaco, se colocam as varas, do Sul a
Oeste, de Oeste a Norte, e do Norte a Leste, deixando assim aberto o Sul. Então
se coloca no Sul, na frente da almofada de pedra, um bastão de madeira de
cerejeira que representa a árvore da vida e que tem uma pena de águia na ponta.
O implorante, que jejuou o dia todo, e que acaba de realizar o Onikare, se
coloca então no lugar. E todas as pessoas presentes se voltam para as Quatro
Direções e oferecem uma oração apropriada à cada uma. O implorante entra no
recinto sagrado, com seu Tchanunpa e vestido tão somente com seu tapa sexo e um
cobertor, a cortina de saquinhos de tabaco se fecha atrás do implorante que
começa a implorar, pedindo ajuda ao Grande Espírito, e se ajoelha no recinto,
orando sem cesar, durante um período que vai de um a quatro dias.
Não é raro que se lhe amarre
fortemente as mãos, os braços, e os pés, a qual é uma forma de sacrifício
extremamente penosa, incluindo que no verão as noites são muito mais frias no Estado de Dakota.
O índio se identifica
espiritualmente com a Qualidade Cósmica, do ser ou coisa que lhe aparece em uma
visão, pode ser um mamífero, um pássaro, um dos elementos da natureza ou
qualquer aspecto da criação. Para que este Poder nunca lhe abandone, o índio
leva sempre consigo alguma forma material que representa o animal ou coisa do
qual ele recebeu seu Poder. Para o índio os animais e todas as coisas
inanimadas são reflexos em forma material dos Princípios Divinos. O índio não
se apega a esta forma como tal, mas ao Princípio que está de certo modo contido
nesta forma.
Quando um homem vai implorar por
uma visão, seus parentes e amigos costumam se reunir em sua tipi, para cantar e
rezar durante os dias e as noites que dura sua imploração. Ao menos uma vez a
cada noite todos saem e olham em silêncio na direção do lugar onde se acha o
implorante, observam com atenção qualquer sinal que possa aparecer nessa
direção, por exemplo, um relâmpago, símbolo da Revelação, considerado um sinal
particularmente favorável.
Alce Negro recebeu sua primeira
grande visão quando tinha apenas nove anos de idade.
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É permitida a reprodução desta postagem desde que citada as fontes conforme abaixo:
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É permitida a reprodução desta postagem desde que citada as fontes conforme abaixo:
Fonte: Os
rituais sagrados foram traduzidos deste livro - Black Elk Speaks -
publicado pela primeira vez em 1932 pelo historiador John Neihardt,
ditado pelo nosso Amado Pai Sagrado Hehaka Sapa em 1931.
Tradução: Hotashungmanitu Tanka na Yutan Kimimila - Witchashawakan
Publicação: wakanwood.blogspot.com